Estabelece diretrizes e procedimentos, no âmbito do Poder Judiciário de Roraima, para a transferência e o recambiamento de pessoas presas.
Constituição da República Federativa.
Código de Processo Penal.
Lei Federal n. 7.210, de 1984 (Lei de Execução Penal).
Lei Federal n. 8.653, de 1993.
Resolução CIDH n. 1, de 2008.
Resolução CNJ n. 350, de 2020.
Resolução CNJ n. 404, de 2021.
RESOLUÇÃO TJRR/TP N. 39, DE 17 DE AGOSTO DE 2022.
O EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RORAIMA, em sua composição plenária, no uso de suas atribuições legais e regimentais, e
CONSIDERANDO os direitos e garantias fundamentais, especialmente o disposto no art. 5º, XXXV, XLVI, XLVIII, XLIX, LV e LXXVIII da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988), bem como os princípios que regem a administração pública, nos termos do art. 37 da CF/1988;
CONSIDERANDO as disposições dos arts. 289 e 289-A do Código de Processo Penal, que dispõem sobre o cumprimento de mandado de prisão fora da jurisdição do juiz processante, ao qual cabe providenciar a remoção da pessoa presa no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida;
CONSIDERANDO o disposto na Lei n. 7.210/1984 (Lei de Execução Penal), no sentido de que a execução penal tem por objetivo proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado, assegurando-se todos os direitos não atingidos pela sentença, incluído o direito à visita de parentes e amigos e a permanência em local próximo ao seu meio social e familiar (arts. 1º, 3º, 41, 42 e 103);
CONSIDERANDO que a execução penal compete à autoridade judiciária, à qual incumbe zelar pelo correto cumprimento da pena, determinar eventual remoção da pessoa condenada e definir o estabelecimento penal adequado para abrigá-la (art. 65; art. 66, III, f, V, g e h, e VI; art. 86, caput e § 3º; e art. 194, da Lei no 7.210/1984);
CONSIDERANDO a Lei n. 8.653/1993, que dispõe sobre o transporte de presos, e a Resolução n. 2/2012, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que proíbe o transporte de pessoas presas ou internadas em condições ou situações que lhes causem sofrimentos físicos ou morais, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e criminal;
CONSIDERANDO as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos (Regras de Mandela), que dispõem sobre providências relativas à transferência e transporte de pessoas presas, incluída à informação aos familiares (Regras n. 7, 26, 68 e 73);
CONSIDERANDO o disposto no art. 17.3 da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, que prevê a manutenção de registros oficiais atualizados das pessoas privadas de liberdade, em especial quanto à transferência para outro local de detenção, ao destino e à autoridade responsável pela transferência;
CONSIDERANDO o item IX dos “Princípios e Boas Práticas para a proteção das pessoas privadas de liberdade nas Américas”, adotados por meio da Resolução n. 1/2008, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em seu 131º Período Ordinário de Sessões;
CONSIDERANDO o teor das resoluções da Corte Interamericana de Direitos Humanos nas medidas provisórias outorgadas em relação ao Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - RJ, Complexo Penitenciário de Pedrinhas - MA e do Complexo Penitenciário do Curado - PE;
CONSIDERANDO a Resolução CNJ n. 350/2020, que estabelece diretrizes e procedimentos sobre a cooperação judiciária nacional entre os órgãos do Poder Judiciário e outras instituições e entidades, prever que a transferência de pessoas presas consiste em ato de cooperação judiciária e determinar que ao Conselho Nacional de Justiça, com o apoio técnico do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo, cabe propor ato normativo regulamentando a matéria (art. 6º, XV e parágrafo único);
CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do CNJ, no Procedimento de Ato Normativo n. 0004354- 63.2021.2.00.0000, na 89ª Sessão Virtual, realizada em 25 de junho de 2021; e
CONSIDERANDO a Resolução n. 404/2021, que estabelece diretrizes e procedimentos, no âmbito do Poder Judiciário, para a transferência e o recambiamento de pessoas presas.
RESOLVE:
Capítulo I
Disposições Gerais
Art. 1º Esta Resolução estabelece diretrizes e procedimentos, no âmbito do Poder Judiciário de Roraima, para a transferência e o recambiamento de pessoas presas.
Parágrafo único. A presente Resolução disciplina a movimentação de pessoas presas entre estabelecimentos prisionais geridos pelo Estado de Roraima, não se aplicando à transferência e inclusão de pessoas presas no sistema penitenciário federal.
Art. 2º Para fins desta Resolução, considera-se:
I – transferência: a movimentação de pessoa presa, do estabelecimento prisional em que se encontra para outro estabelecimento prisional, situado na mesma unidade da federação; e
II – recambiamento: a movimentação de pessoa presa, do estabelecimento prisional em que se encontra para outro estabelecimento prisional, situado em outra unidade da federação.
Art. 3º São diretrizes aplicáveis à transferência e ao recambiamento de pessoas presas:
I – a competência do juiz processante para providenciar a remoção da pessoa presa provisoriamente nos casos em que o mandado de prisão é cumprido fora de sua jurisdição;
II – a competência do juiz indicado na lei de organização judiciária para processar a execução penal e os respectivos incidentes;
III – a articulação interinstitucional e a cooperação entre os órgãos do Poder Judiciário de Roraima, nos termos da Resolução CNJ n. 350/2020;
IV – os objetivos da execução penal de efetivar as disposições da decisão criminal e de proporcionar
condições para a harmônica integração social da pessoa condenada;
V – os princípios da dignidade da pessoa humana, legalidade, devido processo legal, contraditório, ampla defesa e duração razoável do processo;
VI – os princípios da impessoalidade, finalidade, motivação, publicidade, segurança jurídica e interesse público;
VII – o direito da pessoa presa de permanecer em local próximo ao seu meio social e familiar; e
VIII – a realização da movimentação de pessoas presas de forma a respeitar sua integridade física e moral.
Capítulo II
Da Transferência
Art. 4º Compete ao Poder Judiciário de Roraima decidir sobre os requerimentos de transferência apresentados em juízo e realizar o controle de legalidade das transferências determinadas no âmbito da administração penitenciária.
Parágrafo único. A competência do Poder Judiciário de Roraima para decidir sobre os requerimentos de transferência não exclui a atribuição da administração penitenciária para deliberar sobre a questão.
Seção I
Dos requerimentos de transferência apresentados em juízo
Art. 5º O requerimento de transferência pode ser apresentado:
I – pela pessoa presa, por si ou por advogado constituído, advogada constituída ou membro da Defensoria Pública;
II – pelos familiares da pessoa presa;
III – por membro do Ministério Público; e
VI – por representante de conselho da comunidade, conselho penitenciário ou mecanismo de prevenção e combate à tortura.
§ 1º O procedimento de transferência de pessoa presa pode ser instaurado de ofício, sempre que presente algum dos fundamentos previstos no art. 6º desta Resolução.
§ 2º O requerimento de transferência de pessoa presa pode ser apresentado independentemente do tempo de pena já cumprido no estabelecimento prisional em que se encontra custodiada.
Art. 6º A transferência de pessoa presa poderá ser efetuada com fundamento em:
I – risco à vida ou à integridade da pessoa presa;
II – necessidade de tratamento médico;
III – risco à segurança;
IV – necessidade de instrução de processo criminal;
VI – permanência da pessoa presa em local próximo ao seu meio social e familiar;
VII – exercício de atividade laborativa ou educacional;
VIII – regulação de vagas em função de superlotação ou condições inadequadas de privação de liberdade; e
IX – outra situação excepcional, devidamente demonstrada.
Parágrafo único. A transferência de pessoas presas não tem natureza de sanção administrativa por falta disciplinar, nos termos do art. 53 da Lei de Execução Penal.
Art. 7º Para os fins do art. 6º, VIII, a autoridade judicial considerará a ocupação dos estabelecimentos de origem e destino, de modo a evitar sobrepopulação nos espaços de privação de liberdade, riscos à segurança, aumento da insalubridade e a propagação de doenças às pessoas privadas de liberdade e aos agentes que laboram na localidade.
Parágrafo único. No caso do caput, será dada prioridade a outras medidas de redução da população carcerária, em especial àquelas que decorrem da Súmula Vinculante nº 56 do Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo de demais iniciativas.
Art. 8º O requerimento de transferência será apresentado com as informações essenciais à apreciação do pedido e a respectiva motivação e será autuado como procedimento, com tramitação pelo Sistema Eletrônico de Execução Unificado - SEEU.
Parágrafo único. O direito de petição da pessoa presa será assegurado de maneira efetiva, cabendo ao juízo da Vara de Execução penal receber e processar os requerimentos de transferência, observados os direitos de acesso à justiça e à assistência judiciária gratuita, bem como a instrumentalidade das formas.
Art. 9º A tramitação do procedimento de transferência de pessoa presa contemplará:
I – manifestação do Ministério Público e da defesa técnica, quando não tiverem apresentado o requerimento;
II – oitiva da pessoa presa, sempre que não for a requerente, zelando-se pela livre manifestação de sua vontade;
III – consulta à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania – Sejuc; e
IV – direito de informação da pessoa presa, do requerente e dos demais órgãos da execução penal, sobre o andamento do requerimento.
Parágrafo único. A publicidade do procedimento de transferência poderá ser restringida, em hipóteses excepcionais, a fim de resguardar a segurança da pessoa presa.
Art. 10° A decisão que apreciar o requerimento de transferência de pessoa presa deverá ser fundamentada, com análise das questões de fato e de direito.
§ 1º A autoridade judiciária determinará a intimação do requerente, da pessoa presa e da defesa técnica, e do membro do Ministério Público para ciência da decisão.
§ 2º Na hipótese de deferimento do requerimento de transferência, a autoridade judiciária comunicará ainda:
I – a família da pessoa presa, sempre que presentes informações que possibilitem a medida; e
II – a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania – Sejuc, para efetivação da transferência da pessoa presa, com o traslado de seu prontuário médico e bens pessoais.
§ 3º A judicialização prévia de pedido de transferência não obsta a decisão da administração penitenciária sobre a questão, nos casos em que o juízo competente não profira decisão no prazo previsto no art. 800 do Código de Processo Penal.
Art. 11º Em situações excepcionais, é possível o deferimento da transferência de pessoa presa de forma cautelar, hipótese em que as providências de que trata o art. 9º serão realizadas em até 48 (quarenta e oito) horas.
Seção II
Do Controle de Legalidade das Transferências Determinadas pela Administração Penitenciária
Art. 12° O controle judicial de legalidade das transferências determinadas no âmbito da administração penitenciária será realizado à luz das diretrizes e princípios elencados no art. 3º desta Resolução.
§ 1º A Vara de Execução Penal, em cooperação com a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania – Sejuc, atuarão pela harmonização de procedimentos e rotinas administrativas, de modo a contemplar:
I – o procedimento administrativo de acordo com as diretrizes e princípios elencados nesta Resolução, incluída a previsão das hipóteses excepcionais em que necessária a efetivação da transferência antes da conclusão do procedimento.
II – hipóteses excepcionais em que a publicidade do procedimento de transferência poderá ser restringida, a fim de resguardar a segurança da pessoa presa;
III – medidas para coibir o desvio de finalidade e o uso abusivo de transferências, incluída a previsão de responsabilização administrativa.
IV – a comunicação obrigatória ao juízo competente sobre as transferências realizadas, com a disponibilização de acesso ou o envio de cópia dos procedimentos administrativos correspondentes, em até 48 (quarenta e oito) horas;
V – a realização do transporte de forma a respeitar a dignidade e integridade física e moral da pessoa presa, observados o art. 14 desta Resolução e a legislação aplicável;
VI – o cumprimento do prazo previsto no art. 289, § 3º, do Código de Processo Penal; e
VII – a comunicação aos familiares sobre o local de destino da transferência.
§ 2º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o controle judicial poderá ser provocado pelos(as) interessados(as) de que trata o art. 5º desta Resolução, observado o disposto no art. 8º, parágrafo único.
Capítulo III
Dos Recambiamentos
Art. 13° O recambiamento de pessoas presas será determinado pelo juízo da Vara de Execução Penal, observado o procedimento descrito nos arts. 5º ao 10 desta Resolução, e será instrumentalizado a partir de atos de cooperação, nos termos do art. 4º da Resolução CNJ nº 404/2021.
Parágrafo único. Além das pessoas e órgãos de que trata o art. 5º, o pedido de recambiamento poderá ser apresentado pela diretoria de unidade prisional, pela Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania – Sejuc, nas hipóteses previstas no art. 6º ou em caso de necessidade afeta à gestão do sistema carcerário.
Capítulo IV
Do Transporte
Art. 14° As transferências e recambiamentos serão realizados de forma a respeitar a dignidade e integridade física e moral das pessoas presas, observando, especialmente:
I – as condições de segurança no transporte, em conformidade com as normas do Código Nacional de Trânsito Brasileiro, incluídos a adequação dos assentos e cintos de segurança;
II – a iluminação e segurança climática dos veículos utilizados para o transporte;
III – a adoção de mecanismos de prevenção de conflitos durante o período de deslocamento entre as pessoas transportadas, atentando-se aos marcadores de gênero e orientação sexual, evitando-se ainda o transporte no mesmo veículo de pessoas com histórico de desavenças entre si;
IV – a disponibilidade de alimentação e água potável e a realização de parada para refeição e uso de banheiro, considerada a necessidade da pessoa transportada;
V – os cuidados especiais à pessoa presa gestante, idosa, com deficiência, acometida de doença ou que necessite de tratamento médico; e
VI – preservação do anonimato e do sigilo das pessoas transportadas, vedada a exposição pública.
§ 1º Será efetuado o registro da data, da hora de saída do estabelecimento de origem e da hora de chegada no estabelecimento de destino.
§ 2º Será realizado exame de corpo de delito ou laudo de avaliação clínica por ocasião do ingresso da pessoa na unidade de destino, salvo impossibilidade devidamente justificada por escrito.
§ 3º O disposto neste artigo aplica-se ao transporte em caso de transferência que decorra da alteração de regime de cumprimento de pena, bem como ao traslado de pessoas presas para a participação em atos processuais, no que couber.
Capítulo V
Disposições Finais e Transitórias
Art. 15° A Vara de Execução Penal será responsável por consolidar os dados e as boas práticas afetos às transferências e aos recambiamentos junto ao Tribunal de Justiça do Estado de Roraima.
Art. 16° Os sistemas e cadastros de tramitação processual e de gestão da custódia serão adaptados para registrar a movimentação das pessoas presas, de modo a permitir consulta de alocação e dados sobre as demandas de transferências e recambiamentos.
Art. 17° Esta Resolução entra em vigor 30 (trinta) dias após sua publicação.